terça-feira, 24 de junho de 2014

Breve reflexão sobre a violência

Existem violências no mundo que passam despercebidas pelos olhares mais sensíveis, violências essas que ocorrem como decorrência de uma estrutura econômica/política/social baseada em relações de mercado. Estamos todos inseridos numa  lógica onde o  “ser” tem menos valor do que a “coisa”, a não ser que seu corpo – ou mente – possa ser de alguma forma valorizados (seja na prostituição, no esporte ou no campo científico gerando patentes). Logo a “coisa’ – que é uma propriedade privada – ganha relevância frente ao "ser", para além disso, a mesma ganha importância política e social – além da importância econômica inerente a ela.
Vivemos num mundo mediado pelas “coisas”, onde a posse e a manutenção dessa posse tornam-se fatores importantes da vida. Politicamente as “coisas” ou melhor a distribuição de capital e das “coisas” são elementos importantes na “Real Politik”. Uma vez que o ter é mediado pelo acesso ao capital e tal fato se insere dentro de um contexto de desigualdade, onde o cenário político está sob controle de forças conectadas as elites dominantes, que por extensão de seu poder econômico controlam também o cenário político. Portanto a política é também uma forma de se manter – conservadorismo – a distribuição de capital e “coisas”fluindo na mesma direção.
Socialmente, as “coisas” ganham importância na medida em que demonstram “quem nós somos”, o “ter” um celular não se relaciona apenas a possibilidade de se falar com alguém, mas sim ao “status” inerente ao ter um celular de última geração. Como essa lógica está presente em todos os ramos do processo de circulação de mercadorias, encontramos uma sociedade onde a noção de cidadania perde seu valor frente a noção de “ser” consumidor.
Percebemos que este dois aspectos servem para manter as engrenagens da economia em funcionamento, tanto no processo de conservação das engrenagens (aspecto político) quanto no processo de renovação e circulação das “coisas” através da relevância social imbuída ao “ter” – aqui vale lembrar que as “coisas” mantêm uma característica de serem temporalmente validadas, o que gera uma corrida constante pela substituição da “coisa” velha pela “coisa” atualizada.
E para que tudo isso funcione como um relógio, o Estado deve garantir através da violência – não somente física – a continuidade da lógica que rege a sociedade.
Se como violência concebermos as ações que ferem o “ser”, automaticamente teremos uma expansão dentro do horizonte do que compreendemos por violência. Dessa forma a violência se tornaria também a falta de acesso à educação, saúde, saneamento básico, etc. Vale lembrar que em última instância a falta desses e de outros serviços ocasionam inclusive na morte biológica. Seja pela doença ou pela criminalidade na qual muitos excluídos são “levados” a adotarem como estratégia de sobrevivência.
Enfim, podemos dizer que há uma violência direta visível que é tanto aplicada pelo Estado como também imposto aos cidadãos através da criminalidade, como também uma violência indireta – subjetiva – usada como forma de se manter o “status quo”. A diferença entre as duas pode ser percebida pelo fragmento abaixo extraído da obra de Mark Twain intitulada de “Um ianque na corte do Rei Artur”.

“Um cemitério poderia conter os caixões preenchidos pelo breve Terror diante do qual todos fomos tão diligentemente ensinados a tremer e lamentar, mas a França inteira dificilmente poderia conter os caixões preenchidos pelo Terror real e mais antigo, aquele indizivelmente terrível e amargo, que nenhum de nós foi ensinado a reconhecer em sua vastidão e lamentar da forma que merece.”

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